Jovens mães têm futuro incerto

6 de abril de 2015 Comente »
Jovens mães têm futuro incerto

Jornal Mulier – Dezembro de 2013, Nº 119

Gravidez adolescente traz consequências sociais e econômicas sem precedentes para jovens mulheres

Enquanto quase diariamente recebemos notícias sobre pioneirismos e protagonismos das mulheres, como a maior taxa delas entre os concluintes do ensino superior no Brasil ou a chegada aos mais altos cargos de poder político, algumas informações também vêm à tona para nos mostrar que ainda há um longo caminho a percorrer.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) acaba de divulgar dados da “Síntese de Indicadores Sociais 2013”, revelando que 20% de jovens entre 15 e 29 anos fazem parte da geração “nem-nem”: não frequentam a escola nem trabalham, a maioria mulheres: 70,3%. Entre elas, afirma o IBGE, destaca-se a proporção daquelas já mães de ao menos um filho: 30% entre meninas de 15 a 17 anos; 51,6% na faixa etária de 18 a 24 anos e 74,1% daquelas de 25 a 29 anos.

Os indicadores brasileiros são divulgados logo após um outro relatório global revelar que diariamente 20 mil adolescentes com menos de 18 anos tornam-se mães em países em desenvolvimento, colocando a vida dessas jovens em risco devido à maior possibilidade de complicações durante a gravidez e o parto, além de ser um custo de oportunidade de vida para tais jovens.

Segundo o estudo, “Situação da População Mundial 2013 – Maternidade Precoce: enfrentando o desafio da gravidez na adolescência”, publicado pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), “quando uma menina tem o direito de adiar uma gravidez, possivelmente também tem o poder de permanecer na escola e assegura economicamente um melhor trabalho e outras oportunidades”. Citando o caso do Brasil, o relatório diz que o país teria uma produtividade de bilhões de reais anuais a mais no Produto Interno Bruto (soma das riquezas produzidas) se as meninas adolescentes de hoje engravidassem apenas após os vinte anos.

Mas os custos sociais parecem superar os demais. A UNFPA ressalta ser o problema de menor oportunidade futura um destino também reservado a filhas e filhos de meninas adolescentes, pois entre estes é menor a esperança de vida, a saúde é mais precária, e o rendimento escolar é menor.

Inúmeros desafios

As principais causas apontadas para o grande número de gravidez adolescente são o matrimônio infantil, a desigualdade de gênero, os obstáculos aos direitos humanos, a pobreza, a violência e a coação sexual, as políticas nacionais que restringem o acesso a anticonceptivos e educação sexual adequada à idade, a falta de acesso a educação serviços de saúde reprodutiva e o pouco investimento no capital humano de meninas adolescentes.

Há ainda questões relativas à socialização e expectativas por parte das jovens, que posteriormente mostram-se equivocadas. Pesquisas mostram: algumas adolescentes de fato desejam engravidar, seja pela idealização da maternidade em algumas culturas ou pela crença de que a gravidez pode representar uma melhor posição social ou convertê-las em adultas. Algumas investigações em países em desenvolvimento mostram meninas desejosas de ter um bebê para amar (ou uma criança para amá-las). Outras acreditam no poder de um filho para fortalecer os laços com os companheiros, querem também ter filhos aquelas cujas amigas já os têm ou porque precisam demonstrar ser suficientemente maduras e responsáveis para serem mães.

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No entanto, um estudo entre meninas grávidas joga por terra tais ilusões. Ele ouviu das meninas o reconhecimento da gravidez adolescente como algo negativo, com consequências a exemplo do desemprego, perda de um noivo, recriminações de amigos e familiares, sentimento de culpa, dificuldades na escola, complicações durante a gravidez e o parto, risco de contrair HIV, esterilidade causada por aborto e falta de preparo para a maternidade.

No Brasil, a taxa de natalidade de adolescentes pode ser considerada alta por características do contexto de desenvolvimento brasileiro, sendo observado um viés de renda, raça/cor e escolaridade significativo na prevalência desse tipo de gravidez, acometendo principalmente adolescentes pobres, negras ou indígenas e com menor escolaridade. Cerca de 19,3% das crianças nascidas vivas em 2010 no Brasil são filhos e filhas de mulheres de 19 anos ou menos. A UNFPA lembra que muitas dessas gestações adolescentes e jovens não foram planejadas e são indesejadas, inúmeras, inclusive, decorrem de abusos e violência sexual ou resultam de uniões conjugais precoces, geralmente com homens mais velhos. “Ao engravidar, voluntária ou involuntariamente, essas adolescentes têm seus projetos de vida alterados, o que pode contribuir para o abandono escolar e a perpetuação dos ciclos de pobreza, desigualdade e exclusão”.

O papel essencial da educação

A educação é lembrada como um diferencial na prevenção ao problema. Segundo a UNFPA, “as meninas que permanecem na escola por mais tempo são menos propensas a engravidar. A educação prepara as meninas para o trabalho e a subsistência, melhora sua autoestima e posição na casa e na comunidade, além de lhes permitir influir mais nas decisões que afetam sua vida. A educação também reduz a probabilidade de matrimônio infantil e retarda a maternidade, proporcionando partos mais saudáveis”.

Outras medidas recomendadas para romper esse ciclo e assegurar às adolescentes e jovens seu pleno potencial são recomendadas: investir em políticas, programas e ações que promovam os direitos, a autonomia e o empoderamento de adolescentes e jovens, em especial meninas, em relação ao exercício de sua sexualidade e de sua vida reprodutiva, para que possam tomar decisões voluntárias, sem coerção e sem discriminação; garantir o acesso de adolescentes e jovens à informação correta e em linguagem adequada sobre os seus direitos, incluindo o direito à saúde sexual e reprodutiva, bem como o acesso à educação integral em sexualidade; assegurar o acesso às ações e aos insumos de saúde sexual e reprodutiva, tais como preservativos e contraceptivos, para que gravidez não planejada seja evitada; envolver as famílias, comunidades, serviços e profissionais de saúde na resposta adequada às necessidades e demandas de adolescentes e jovens, incluindo aquelas relacionadas à saúde sexual e reprodutiva; e garantir a participação de adolescentes e jovens nos processos de tomada de decisões, como condição fundamental para os avanços democráticos e para a realização de seus direitos.

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