Mortalidade materna cai, mas aborto continua a ser uma das principais causas de óbito materno

2 de março de 2013 Comente »
Mortalidade materna cai, mas aborto continua a ser uma das principais causas de óbito materno

Cartum de Carlos Latuff 2010

Jornal Mulier – Março de 2012, Nº 98

No momento em que o Ministério da Saúde divulga dados mostrando a queda da mortalidade materna no Brasil, a Organização das Nações Unidas (ONU) cobra do país medidas para proteger milhares de brasileiras que perdem a vida todos os anos em decorrência de complicações por abortos. Durante a 51ª sessão do Comitê para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres, realizada em Genebra, entre os dias 13/02 e 02/03, o Brasil foi duramente cobrado e criticado, sendo o governo acusado de falta de ação a respeito da morte de mulheres por causa de abortos de risco.

Segundo dados do Ministério da Saúde, entre os anos 1990 e 2010, a taxa de mortalidade materna no Brasil caiu de 141 para 68 mortes por 100 mil nascidos vivos, mas esse número ainda é alto, quase o dobro da meta de 35 óbitos por 100 mil nascidos vivos estipulada pelos Objetivos do Milênio da Organização das Nações Unidas para o ano de 2015. O aborto é a quarta causa de mortalidade materna das brasileiras, ficando atrás apenas de hipertensão gestacional (13,9 óbitos por 100 mil nascidos vivos), hemorragia (7,9), infecção pós-parto (4,4) e doenças circulatórias (4,2), causando a morte de 3 mulheres a cada 100 mil nascidos vivos. Anualmente no Brasil, são realizadas aproximadamente 200 mil curetagens no Sistema Único de Saúde, procedimento muito utilizado após o processo abortivo, seja provocado ou não, e dados extra-oficiais dão conta da realização de 1 milhão de abortos clandestinos.

Criminalização x morte materna

“O que é que vocês vão fazer com esse problema político enorme que têm?”, perguntou à delegação brasileira em Genebra a perita suíça Patricia Schulz, em referência à criminalização do aborto, segundo ela ligada à alta taxa de mortes por ano. Para os especialistas da ONU, a divisão na sociedade brasileira sobre como tratar o assunto não pode ser motivo para permitir que as mortes continuem ocorrendo, cobrando medidas efetivas do Estado. A perita Magaly Arocha afirmou que as mulheres vão continuar abortando, é uma realidade, “o comitê da ONU não pode defender o aborto. Mas queremos que o Estado garanta que mulheres possam zelar por suas vidas”.

A ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Eleonora Menicucci, afirmou que a questão do aborto não diz respeito ao Executivo e, sim, ao Congresso, existindo um projeto de lei em tramitação. Sua resposta não poderia ser diferente, visto que por ser uma defensora do aborto em sua vida acadêmica e pessoal, ela já foi duramente criticada por isso ao ser escolhida para o cargo pela presidenta Dilma Rousseff. Para quem não se lembra, o aborto foi um dos principais temas da campanha das últimas eleições presidenciais, gerou discussões acaloradas entre defensores e entidades contrárias, fazendo com que o corpo feminino fosse usado como moeda de troca política sem levar em consideração que é um problema de saúde pública. Diante da possibilidade de vitória de Dilma e possível legalização do aborto no Brasil, a então candidata assinou um documento público se comprometendo a não enviar qualquer projeto do Executivo sobre aborto para o Congresso.

A socióloga Eva Blay, que em 1993, como senadora, apresentou um projeto de lei descriminalizando o aborto e estabelecendo novas condições e limites para sua realização, afirmou ao Jornal Mulier que “os dados mostram que, queria ou não, o aborto é realizado por mulheres, de todas as idades, sem condições de manter uma gestação seja por razões econômicas, emocionais, psicológicas. Isso tem levado a uma elevadíssima mortalidade feminina que poderia ser evitada. Ninguém é a favor do aborto, mas é injusto ignorar as decisões que a mulher toma premida por suas necessidades”.

Reforma do Código Penal

Texto de anteprojeto de reforma do Código Penal deve trazer mais elementos para a discussão da temática. Há a proposta que descriminaliza o aborto realizado até a 12ª semana de gravidez quando, a partir de um pedido da gestante, o médico constatar que a mulher não apresenta condições psicológicas de arcar com a maternidade. Também prevê que o aborto de anencéfalos não seja considerado crime, questão já sob julgamento do Supremo Tribunal Federal. No atual Código Penal, somente abortos realizados para resguardar vida da gestante e devido à gravidez resultante de estupro são permitidos.

Segundo o relator da comissão, o procurador regional da República em São Paulo, Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, a proposta não acaba com o crime de aborto, ela amplia as situações em que não será criminalizado. Como afirmou ao jornal “Folha de S. Paulo”, garantir aborto a mulheres sem condições psicológicas serve para proteger mulheres em situação de muita vulnerabilidade. “O aborto é o pior método contraceptivo que existe, mas criminalizá-lo pode ser simplesmente uma grande injustiça para com a mulher”.

Fontes

Jornal “Folha de S.Paulo”, 25/02/2012.

Jornal “O Estado de S. Paulo”, 18/02/2012.

Observatório Brasil da Igualdade de Gênero – ww.observatoriodegenero.gov.br

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