Lançada maior pesquisa já realizada sobre parto e nascimentos no Brasil

15 de abril de 2015 Comente »
Lançada maior pesquisa já realizada sobre parto e nascimentos no Brasil

Jornal Mulier – Junho de 2014, Nº 125

Excesso de cesáreas preocupa especialistas, prática pode ser prejudicial à saúde das mulheres e dos bebês 

No último dia 25/05, foi divulgado o que é considerado o maior estudo sobre parto e nascimentos no Brasil. A pesquisa “Nascer no Brasil”, coordenada pela Fiocruz, em parceria com diversas instituições científicas do país, entrevistou 23.894 mulheres em maternidades públicas, privadas e mistas de 191 municípios, incluindo capitais e cidades do interior de todos os estados.

A principal constatação foi o quadro de excessos de cesáreas no Brasil, com médias muito acima das recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo a referida instituição, o ideal é a cesariana ser realizada em somente 15% dos partos. Mas, no caso brasileiro, o procedimento chega a 52% dos nascimentos, alcançando 88% no setor privado de atendimento à saúde. As cesarianas foram frequentes inclusive entre adolescentes (42%), fato que preocupa os pesquisadores, pois mulheres com vida reprodutiva precoce tendem a ter número maior de filhos e, consequentemente, estão expostas a mais riscos nas gestações futuras.

A coordenadora da pesquisa, Maria do Carmo Leal, ressalta que o número excessivo de cesarianas expõe desnecessariamente as mulheres e os bebês aos riscos de efeitos adversos no parto e nascimento. “O índice elevado de cesarianas se deve a uma cultura arraigada no Brasil de que o procedimento é a melhor maneira de se ter um filho. Em parte porque, no Brasil, o parto normal é realizado com muitas intervenções e dor”, esclarece.

Desrespeito à vontade das mulheres

Outro dado da pesquisa chama a atenção e mostra como as mulheres têm pouca autonomia sobre o próprio corpo. O estudo aponta que quase 70% das brasileiras desejam um parto normal no início da gravidez. Entretanto, são pouco apoiadas em sua preferência durante o pré-natal, especialmente nos serviços privados, além de receberem a influência de amigas e familiares contra a sua escolha.

O pré-natal é apontado como inadequado e tardio, apesar da cobertura universal no país; 60% das gestantes iniciaram o pré-natal tardiamente, após a 12ª semana gestacional, quando o ideal é iniciá-lo quando descoberta a gravidez. Além disso, cerca de um quarto delas não teve o número mínimo de seis consultas recomendado pelo Ministério da Saúde. A mortalidade neonatal, por sua vez, esteve associada ao baixo peso ao nascer, ao risco gestacional e à inadequação da atenção ao pré-natal e ao parto, indicando uma qualidade não satisfatória da assistência.

parto

Embora o parto normal seja considerado a melhor maneira de ter os bebês, a pesquisa afirma haver a predominância de um modelo de atenção extremamente medicalizado, com intervenções excessivas e uso de procedimentos que, além de não serem recomendados pela OMS como de rotina, provocam dor e sofrimento desnecessários quando utilizados sem indicação clínica. “A maioria das mulheres ficou restrita ao leito e sem estímulo para caminhar, sem se alimentar durante o trabalho de parto, usou medicamento para acelerar as contrações e deu à luz deitada de costas, muitas vezes com alguém apertando sua barriga”, revela o estudo.

As vantagens de contar com modelos de parto humanizado, com a presença de enfermeiras obstétricas e obstetrizes como líderes e responsáveis primários pela realização de partos normais, foram constatadas entre as gestantes entrevistadas. Com o auxílio dessas profissionais aumentam as chances de partos espontâneos e diminuem as intervenções desnecessárias, sem comprometer a saúde das mulheres e dos bebês. “Este modelo de parto inclui as chamadas boas práticas obstétricas, como métodos não farmacológicos para alívio da dor, estímulo à movimentação, liberdade para se alimentar e posição verticalizada na hora de parir. Juntos, esses procedimentos tornam o parto mais confortável e menos doloroso”, explica Maria do Carmo.

Saúde materna e do recém-nascido

Talvez por este modelo intervencionista e pouco natural, é alto o percentual de depressão materna, conforme constatado na pesquisa em 26% das mães entre 6 e 18 meses após o parto, sendo mais frequente entre as mulheres de baixa condição social e econômica, nas pardas e indígenas, nas mulheres sem companheiro, que não desejavam a gravidez e já tinham três ou mais filhos.

Os recém-nascidos também sofrem as consequências. A proporção de nascimentos prematuros (antes de 37 semanas) chega a 11,3%. Quando comparado aos dados populacionais da Inglaterra e País de Gales, a ordem brasileira foi 55% maior. Em relação aos bebês que nasceram com 37 ou 38 semanas gestacionais, a proporção foi de 35%. “Embora não sejam considerados prematuros, são bebês que poderiam ganhar mais peso e maturidade se tivessem a chance de chegar a 39 semanas ou mais de gestação. A epidemia de nascidos com 37 ou 38 semanas no Brasil é, em parte, explicada pelo número elevado de cesarianas agendadas antes do início do trabalho de parto, especialmente no setor privado”, alerta o estudo.

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