Mulheres estão pouco à vontade em ambiente de trabalho técnico e masculino da área de Tecnologia de Informação

2 de março de 2013 Comente »
Mulheres estão pouco à vontade em ambiente de trabalho técnico e masculino da área de Tecnologia de Informação

Foto: Reprodução

Jornal Mulier – Maio de 2012, Nº 100

As mulheres estão presentes em todos os setores no mercado de trabalho, mas sua presença ainda é tímida em algumas áreas. Este é o caso da Tecnologia de Informação ou TI, que concentra apenas 19% de mulheres no Brasil. A desproporção é também visível mundialmente, levando a discussões como na União Internacional de Telecomunicações, agência da Organização das Nações Unidas especializada em tecnologia de informação e comunicação (TICs). A entidade assegura ser preciso defender uma carreira tecnológica pautada na criação de oportunidades para mulheres e meninas, ajudando a capacitá-las para que atinjam suas metas e aspirações ao mesmo tempo auxiliando a suprir lacunas de um setor em rápida expansão. Ressaltando que empregos envolvendo TICs estão entre os de melhores remunerações e perspectivas de longo prazo.

Segundo a pesquisadora da Universidade de Campinas (Unicamp) Bárbara Castro, exemplos de profissionais de TI são aquelas pessoas que trabalham na estruturação e no gerenciamento de banco de dados, criação de softwares e desenhos de páginas na internet, atividades que transformam conhecimento em códigos e interfaces, permitindo arquivar, catalogar, organizar, pesquisar e trocar informações com maior agilidade. São especialistas e engenheiras(os) em computação, analista de sistemas, programador(a) de informática e técnicas(os) em operação em programação e operação de computadores. Elas estão em maioria na análise de sistemas e como técnicas em operação de computadores. Eles são principalmente técnicos em programação. Em pesquisa de ocupações, a autora não encontrou nenhum registro de mulheres como engenheiras de computação/desenvolvedoras de software e especialista em informática.

Conflito entre feminino e masculino no ambiente de trabalho

Bárbara Castro afirma que estudos internacionais também apontam para a ocupação de setores menos duros da área de TI pelas mulheres. Elas preferem estar em nichos mais periféricos e femininos, como designer de websites, gerentes de projetos e técnicas que inserem dados, uma espécie de negação em dizer que estão inseridas em um meio de habilidades consideradas muito masculinas, em que precisam abrir mão de características que entendem fazer parte de sua identidade feminina.

Tal conflito de identidade fica evidente em entrevistas com trabalhadoras de TI. Trabalhando em um setor muito masculino, elas acabam por se masculinizarem. Muitas vezes usam como estratégia a neutralidade no modo de vestir, para não chamar muita atenção, mas assim passam a ser consideradas lésbicas, segundo a autora, mesmo não sendo esta a opção sexual das mesmas. Ao contrário, quando se vestem de maneira neutra e preferem um estilo mais feminino, costumam ser confundidas com a secretária da empresa pelos colegas. Ou seja, o espaço profissional técnico é tão associado com o masculino que as mulheres ficam pouco à vontade no ambiente de trabalho. Dessa forma, optam (ou são levadas a optar) por trabalhos mais voltados à comunicação com clientes dentro da área de TI, cujas habilidades consideradas femininas como paciência e simpatia são necessárias, levando à feminização dessas atividades assim como as desvalorizando, acarretando em menores salários femininos e deixando as mulheres em níveis de trabalho hierárquicos mais baixos se comparado aos masculinos, mesmo tendo maior escolaridade.

Outra constatação interessante da pesquisadora da Unicamp é o tipo de contrato de trabalho das mulheres e dos homens inseridos no ramo de TI. Elas estão mais no mercado formal de trabalho, como empregadas, do que os homens. A flexibilidade de horários para as mulheres não é bem vista no setor, pois os empregadores acreditam ser difícil a conciliação entre trabalho e família. Por isso as trabalhadoras de TI sentem-se mais seguras e menos discriminadas ao optarem por ocupações mais tradicionais, com horários fixos e menos flexibilidade e mobilidade. A flexibilidade é diferente para mulheres e homens, para elas é usada para conciliar trabalho pago e não pago. Já para eles, visa acumular mais renda, pois, sem as preocupações dos cuidados, geralmente relegadas às mulheres, podem acumular vários projetos e trabalhos.

Lutando contra o preconceito

Em virtude de todas as adversidades, as próprias profissionais de TI têm se unido para discutir sua situação, sendo a internet uma importante ferramenta. Mulier conversou com Márcia Santos Almeida, analista de sistemas, integrante do conselho gestor e responsável pelo núcleo de mídias sociais do grupo Mulheres na Tecnologia. O MNT-Mulheres na Tecnologia nasceu em janeiro de 2009, em Goiânia, com objetivo de encontrar o motivo para a baixa quantidade de mulheres na área de TI. Segundo Márcia, foram criados uma lista de discussão e um site. “Com isso fomos encontrando mais e mais meninas que trabalham ou estudam TI, outras apenas curiosas. Logo definimos missão, visão, valores e objetivos. Através das mídias sociais conseguimos atingir um grande número de pessoas do Brasil que acreditam no potencial feminino na área de TI: homens e mulheres formam nosso grupo que não quer separar um do outro, mas busca a equidade de gênero. O nosso site (www.mulheresnatecnologia.org/) é um espaço para elas mostrarem seu talento e conhecimento através dos mini currículos e artigos que publicam”. Além do MNT, outros grupos vêm surgindo com objetivo de valorização das mulheres de TI: Feminino Livre, Garotas CPBR, GGD Brazil, entre outros. Para Márcia, a iniciativa, que trabalha com método colaborativo, “abriu um leque de oportunidades devido à participação nos eventos, workshops e oficinas. Tudo isso favorece o networking e o crescimento profissional para quem está começando na área”.

A analista de sistemas reconhece o preconceito como o principal problema enfrentado pelas mulheres ao ingressarem na área. “Há a associação do perfil feminino às áreas de humanas e não às exatas. Muitas mulheres disseram encontrar dificuldades ao disputar uma vaga porque era política da empresa não admitir uma mulher no meio de muitos homens. Muitos esquecem que a capacidade intelectual é igual para ambos os sexos. Entendemos que somos diferentes sim, biologicamente, fisicamente, entretanto a capacidade de desempenhar um determinado cargo ou posição numa empresa não se justifica pelo sexo”, assegura.

Fonte

CASTRO, Bárbara. “Gênero e flexibilização do trabalho: uma análise do setor de TI”. Revista de Ciências Humanas e Artes – Ariús, Campina Grande, v. 17, n. 2, jul.dez. 2011.

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